terça-feira, 28 de agosto de 2007

Profissões...

Um especialista em formação profissional falava na TV Câmara e eu tentava compreender seus argumentos! Era uma dessas muitas comissões que pululam na Câmara dos Deputados. Dizia ele que há um desperdício na oferta de sujeitos com nível superior no Brasil. A oferta de cursos como Medicina e Enfermagem é absurda! Em relação ao número de Escolas de Direito, superamos muitos países cuja economia são muito mais fortes que a nossa! A exposição trazia muitos, mas muitos gráficos repletos de percentuais para cada uma das profissões que mais atraem às pessoas! Desses percentuais, não sei explicar o motivo, um me atraiu deveras por achar demasiado grandioso. Em meio a todas aquelas profissões, a engenharia trazia um percentual assombroso: apenas 35% dos engenheiros formados no Brasil, dizia o especialista, estão trabalhando na sua área de atuação! Quase que de imediato uma dúvida me acorreu: onde será que trabalham os "engenheiros " do Brasil?!
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Trazendo para a nossa seara, existem na Educação Física diversas subdivisões que não se intercomunicam! Uma aponta para os estudos voltados para a área da Educação; outra, com os estudos do Lazer, uma terceira vai gravitar na área da Atividade Física e Promoção da Saúde e há, ainda, aquela que vai trabalhar apenas com o esporte! Já houve tempo em que todos pensavam em ter uma academia de ginástica! Era lugar comum, os indivíduos ou queriam ter ou trabalhar nesse espaço de atuação profissional. Uma estudante recém ingressa perguntara se o curso que ela havia sido aprovada lhe garantiria um emprego num desses espaços; obteve como resposta que nenhuma profissão poderia garantir isso, nenhuma! Aborrecida, abandonou o curso, foi tentar outra coisa! As pessoas entram na universidade com a imagem que lhes é apresentada pelo mercado, são altamente estimuladas: seja isso, faça aquilo! Afinal, sob a égide do capitalismo "querer é poder"! Com o número de Escolas de Educação Física no Brasil, é bem provável que estejamos beirando ao percentual dos engenheiros, quiçá maior! Para se ter uma idéia, havia na Bahia até 1988, ano de de ingresso da primeira turma da Universidade Federal da Bahia, apenas um curso, o da Universidade Católica do Salvador. Hoje, no Estado, temos mais de vinte cursos, ou seja, um curso foi se "estruturando" a cada ano nos últimos vinte anos; uma pergunta pode ser feita neste momento: para onde estão indo os professores formados por todos esses cursos?!
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Quem já não ouviu pais conversando e não percebeu o orgulho quando falam o que o filho está fazendo Medicina ou Direito? Mesmo que o curso seja lá no Sul do mundo, há uma euforia desmedida!Quando comecei a trabalhar em uma escola de Jequié, em 1999, uma dúvida atroz me acompanhava. Sempre quisera saber para onde iam todos aqueles jovens que saíam do ensino médio a cada ano, já que grande parte deles, ou seja, a sua grande maioria, não conseguia entrar na universidade? O jovem acaba subempregado!
Com as especializações sugeridas pela divisão social do trabalho e também pela "anarquia" do modo de produção capitalista, termina-se produzindo e elaborando coisas que tenham valor de troca em detrimento ao valor de uso. O fato é que já é perceptível que muitas profissões estão totalmente saturadas, é o caso do Direito. Embora dizendo outra coisa, a Ordem resolveu dificultar a vida dos recém-formados! O que não deixa de ser curioso! O sujeito se forma se perder a seleção da ordem, é advogado, mas não é advogado, não é paradoxal? O dito é que há muitos cursos de direito sem qualidade. É bem provável que seja assim, mas mesmo que todos fossem muito bons, ainda assim, não haveria espaço para tantos rábulas! Essa "Seleção Natural" do Direito, logo, logo, vai chegar àquelas profissões que sofrem do mesmo mal, isto é, têm grande impacto social, mas economicamente já não rendem tanto como rendiam, caso da Medicina, Arquitetura, Engenharia, entre outras, contudo a cada ano esses profissionais são despejados aos montes no mercado, infelizmente, para eles, já não têm mais o valor de troca que tinham...

segunda-feira, 27 de agosto de 2007

"Pesquisadores"...

Final de semestre acadêmico é sempre tão igual, qualquer mudança entre um e outro é quase imperceptível! Vem sempre acompanhado de um acúmulo brutal de tarefas, tanto para alguns professores, como para a grande maioria dos estudantes! É um corre-corre sem fim. É um "digitar" de trabalhos para fins avaliativos incomensurável! Sei que, de forma perversa, tenho chamado essa "geração" de "control C\control V", faço a mea culpa, mas que um sem-número deles usam desse artifício, isso é fato! Rio de forma solitária quando recebo um trabalho e percebo que o "copiar/colar" não foi sequer lido pelo "autor"! Esse processo, às vezes, é tão grosseiro que se assemelha àqueles trabalhos mal feitos do tempo do antigo segundo grau! O computador acabou com a "pesquisa" feita diretamente dos livros, com ela os "autores" chegavam a ficar com calos nos dedos, porém com o avanço tecnológico, o que era extremamente dolorido, hoje sequer ajuda a coordenação motora fina dos "pesquisadores"!
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Não sejamos tão duros a ponto de culpabilizar apenas aos estudantes pela "pesquisa" mal ajambrada da web, se isso pode ser chamado de "mal da preguiça", no outro extremo estão os seus "mestres", estes fazem o que é conhecido nos corredores como "migué". Verdadeiros "gênios" da pesquisa cobram os trabalhos e avaliam pela cara do estudante e quantidade de páginas. Houve um caso curioso que ilustra muito bem esse círculo vicioso! Um estudante que teimava que sabia como construir um problema de pesquisa. Mostrava-lhe que havia umas incoerências na sua elaboração, mas ele não aceitava, afinal determinada professora lhe dissera que ele sabia como fazer, o professor o perseguia com certeza! Para resolver o "problema", foi preciso procurar a tal professora para saber como fora a caminhada dele sob sua direção. Para encurtar a conversa, o projeto de pesquisa que era parte da avaliação jamais, em tempo algum, fora lido! Casos como esse se repetem à exaustão!
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As monografias de final de curso, também conhecidas como TCC, estão se tornando um verdadeiro cancro, justamente por causa dos já citados "control c/control v"! Mas o descalabro não pára por aí, há também as "empresas" que elaboram qualquer "pesquisa" por um precinho bem camarada! O curioso neste fato é que esse não é um fenômeno local. Remi Hess* afirma que já se defrontou com pessoas que lhe pediam para escrever suas teses e olha que essas já deixaram a graduação há muito tempo! É bem possível que todo mundo concorde que escrever não é tarefa fácil. Sabe-se que para que a escrita aconteça, sua irmã siamesa, a leitura, tem que estar presente, ou seja, sem leitura a escrita é uma equação cuja incógnita não tem solução!
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É neste contexto que aparece a figura do orientador, aquele que vai ajudar o neófito na elaboração da sua monografia! Para uns coisa fácil e tranquila, para outros sofrimento constante que só termina quando a monografia é apresentada! Há orientandos que são chamados de borboletas, aqueles que basta uma leve brisa para que alcem seus vôos até as estrelas, mas existe a contrapartida: os elefantes. Esses paquidermes dificultam seu próprio processo porque não ouvem, não pensam, além de pesados são surdos! Quando o final de semestre coincide com essas defesas e elas são determinantes para a formatura, sai de baixo, porque é confusão na certa! Começam as ameaças veladas, do tipo: "só não formo se você não quiser"! Orientei um sujeito que seu trabalho não andava, parecia cachorro correndo atrás da própria cauda! Estando no auge da irritação o cara me perguntou: "o que não está bom"? É neste momento que o orientando vira seu próprio orientador! Não há explicação que o convença que o trabalho está frágil, sem sustentação metodológica. O orientador é exigente demais, uma monografia não é uma tese de doutorado; Fomos à defesa, cujo resultado foi sua reprovação! Quem foi o culpado? O orientador! Disse certa feita que escrever era como parir, embora nunca tenha feito tal ato, mas uma orientanda confirmou a tese, afirmando: "eu que já tive dois lhe digo: é muito pior!" Um doutorando ameaçou matar seu orientador caso não o levasse à defesa. O orientandor era Remi Hess, o lugar: a França! O que se percebe é que no ambiente acadêmico, aqui ou em alhures, a pesquisa estimula a vaidade e faz com que muitos medíocres pensem que são gênios...
*HESS, Remi. Produzir sua obra: o momento da tese. Brasília: Liber Livro Editora, 2oo5.

sábado, 25 de agosto de 2007

Alienação...

O que acontecia no Coliseu Romano com os vencidos era algo que, mesmo passado tanto tempo, intriga e provoca. Os eventos tinham como atração principal a matança dos gladiadores vencidos e, por uma estranha razão, amorteciam as revoltas! Quando vociferamos nos espetáculos esportivos com os vitoriosos Bernadinhos, Ronaldinhos e Ricardinhos, de uma forma ou de outra, retomamos, quase sem querer, àqueles tempos em que os oprimidos "viviam" uma alienação tão brutal, que fazia com que os pobres miseráveis torcessem para que outros pobres miseráveis se destruíssem, e aguardavam ansiosamente que o dedo polegar do imperador se voltasse para baixo, sacramentando a morte do derrotado! O que aproxima os dois "mundos" é o sentimento de vitória, embora o miserável romano, diferente do miserável brasileiro que tem a morte metafórica do vencido, conseguia ver as vísceras expostas do perdedor bem ali embaixo do seu nariz e se deliciava com o cheiro de sangue derramado!
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Estávamos eu e minha filha conversando sobre o que é ser torcedor, logo após um jogo a que fomos e que nosso time saiu derrotado! Nossa atenção foi atraída para uns torcedores que lentamente enrolavam suas bandeiras para guardá-las para a próxima partida. Sem preconceito, pelo menos aparente, ficamos traçando o perfil desses sujeitos que estão em todas as partidas, faça chuva, faça sol, e são sempre os primeiros a chegar e sempre os últimos a sair. Naquele dia, a partida fora à noite, por isso, parte do tempo em que guardavam as bandeiras era às escuras, a direção do estádio apagara os principais refletores! Estes sujeitos, geralmente, são sub-empregados, ganham uma ninharia e nem sempre têm carteira assinada. O mais interessante é que esses abnegados gastam os seus parcos "vinténs" para ver seu time, mesmo que, às vezes, sacrifiquem sua própria sobrevivênvia por essa estranha paixão!
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Faz alguns anos, voltava eu da casa de uma amiga, depois de uma grande vitória da seleção da Nike, digo, brasileira, na copa do mundo, quando desabou uma chuva torrencial e, em meio a ela, apareceu um cidadão que não saberia precisar a idade já que, às vezes, as aparências enganam, principalmente quando se trata de nordestino. Este era filho do Estado de Sergipe. Pediu-me ele que o levasse até um ponto difícil de se perceber no meio daquele chuvarada toda. A primeira surpresa: em seus braços estava uma criança que talvez tivesse um ano, um pouco mais, um pouco menos, o que posso afirmar é que ainda era criança de colo! O agasalho que eu tinha era uma sombrinha velha que mal cabia a mim, mas mesmo assim ele se aproximou e fomos os três ao lugar que ele apontava. Minha preocupação era evitar que a criança se molhasse e a consequência do ato foi que nos molhamos eu e o pai dela! Dissera que saíra para pegar alimento! Quando vi o lugar que ele indicou que a criança dormiria, quase "desabei"! Era um pedaço de papelão sob uma marquise de um pequeno mercadinho! Ao nos despedirmos, desejei-lhe um "tudo de bom". Sei que é a frase mais tola, patética e fora de propósito que poderia ter dito, mas naquele momento, por mais que tentasse não conseguiria dizer outra coisa, evitei cair na costumeira armadilha hipócrita dos "beija-flores" que acolhem no seu seio uns pobres miseráveis e bradam felizes que fizeram a sua parte, ah, que maravilha seria se todos fizessem como eles!
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As três situações têm em comum, além do espetáculo esportivo, se é que podemos dizer que a matança dos gladiadores no Coliseu, possa ser chamada de esporte, a miserabilidade dos indivíduos que torcem, vibram, gritam pelo gladiador favorito, time, seleção, mesmo que em alguns momentos, sua situação seja das piores, não tenham nem o mínimo necessário, mas não importa, a alienação os torna vitoriosos, porque acima de tudo está a paixão! Os mais exaltados dirão que sempre haverá pobres no mundo e que casos como estes acontecem em todos os rincões e podem usar a questão do panis et circenses como argumento irrefutável, ou seja, em todos os tempos e lugares os oprimidos esmagam os oprimidos usando o discurso do opressor! A alienação permite achar natural aquilo que é histórico. Se não fosse assim, perderíamos a chance de treinar a nossa hipocrisia solidária ano após ano, na hora de discar aqueles números indefectíveis daquele programa que há mais de 22 anos, faz o papel do Estado através de uma "política pública" e salva da pobreza as miseráveis criancinhas brasileiras...

quinta-feira, 23 de agosto de 2007

Esporte para Deficientes...

Estávamos em uma aula de História Antiga, na universidade, o assunto abordado era as Cidades-Estado gregas, quando uma colega começou a chorar. Fiquei aturdido, o fato é que ninguém entendeu o que estava acontecendo. Quem chorara fora Maysa, uma das estudantes mais "fortes" e experientes entre nós. Senti uma vontade muito grande de perguntar o motivo do choro, mas, meio constrangido, emudeci. Disse, cá comigo, que há coisas que não precisamos saber, não é mesmo? Entretanto, por conta da intensidade das lágrimas, a causa veio à tona um tempo depois e tornou-se pública!
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Sabe-se que em Esparta as pessoas consideradas deficientes, quando nasciam, eram atiradas do alto de um penhasco, não havia espaço para os considerados anormais; Vivia-se no modo de produção escravista. Na realidade, Maysa tinha um filho com deficiência motora e, é óbvio, que se tivesse nascido naquele momento, seria um dos que seriam sacrificados e ela, enquanto mãe, sabia disso e, naquele momento, lhe veio à memória a "política de saneamento" espartana! Você pode dizer que esse é um drama um tanto quanto piegas, afinal, tanto espacial quanto temporalmente há uma distância cavalar, mas mãe quando é mãe o afetivo está sempre à flor da pele!
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Sabemos que o modo de produção que rege as nossas vidas tem no lucro e na exploração sua base de sustentação! Temos alguns discursos enganosos, aqueles que afirmam uma coisa, mas que no fundo, no fundo, querem dizer outra bem diferente. Um exemplo bem nítido disso, vimos nos tais dos jogos pan-americanos para os deficientes, chamados de forma eufemística de parapan, embora não aconteça paralelo ao dos normais. A postura dos atletas deficientes a cada dia fica mais e mais parecida com a dos ditos eficientes! Já tinha notado isso em outras oportunidades, mas percebo que cada vez mais as competições se acirram, chegando ao paroxismo dos outros jogos! Houve "atleta" que competiu com fratura, porque precisava ganhar um número xis de medalhas, para engradecimento da pátria! Infelizmente o inocente útil, Clodoaldo, não ganhou todas as medalhas que tinha previsto, tinha um mexicano no caminho! O uso dessas "aberrações" é tão intensa que os normais deveriam rever todos os seus valores. Como podem pessoas naquelas condições ser capazes de grandes proezas e nós outros ficamos reclamando da sorte, reclamando de "barriga cheia"! Isso é bem característico do modo de exploração!
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Nesta lógica escrota, os defientes produzem, segundo alguns, às vezes, tanto quanto os normais e são bem mais baratinhos. O discurso da inclusão, que tanto professor de Educação Física, de boa fé, acredita e chora com as vitórias dos seus pupilos, é tão falacioso quanto movimento sustentável no modo de produção capitalista! Sabe-se que o que Esparta fazia com os sujeitos incompatíveis com a sua política era extremamente perverso e desumano, mas menos hipócrita que o discurso da inclusão vinculado, hoje, pelo modo de produção capitalista. Em um modo de produção em que a eficiência é apregoada aos quatro cantos do planeta, o discurso ideológico encontrou um eufemismo para falar dos deficientes; não, eles não são ceguinhos, aleijados, deficientes mentais, não! Chamemo-los de pessoas com necessidades especiais! Essa preciosidade, não muda em nada as condições destas pessoas, muito pelo contrário, reforça uma postura hipócrita que sinaliza para uma cínica "igualdade" que só existe na cabeça dos ingênuos!
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O mundo é pensado para e pelos normais, as concessões são meras condescendências! Tivemos o caso do atleta deficiente argentino, Carlos Raul Maslup, que ganhou o bronze no tênis de mesa. Sofreu um AVC (acidente vascular cerebral) um dia antes do fim dos jogos e teve dificuldade de encontrar hospital para um atendimento rápido e eficiente. Teve morte cerebral confirmada nesta quarta-feira, 22/08/2007. Como se sabe, o tempo é fator determinante no tratamento do AVC! Uma entidade de para-atletas alegou que, em relação à saúde, o tratamento oferecido aos deficientes foi de qualidade inferior! O mais estranho de tudo isso é que o uso das imagens desses "super homens sem-pernas-sem-braços" foi tão ideologicamente indecente, com o objetivo de provocar descaradamente comoção nacional com as suas vitórias, contudo a eles, enquanto símbolo de superação tão apregoada, foi reservado, apenas, um pequeno espaço de pé de página na mídia que os ovacionou durante as competições, para falar do obituário de um dos seus ilustres representantes, um triste fim para uma pessoa com necessidade especial...

terça-feira, 21 de agosto de 2007

Casa às costas...

Acho que quem realmente vive bem, e sem estresse, é o caramujo. Claro! O sujeito não tem nenhuma preocupação com habitação, a casa está onde ele está: sempre às suas costas. Esta segue-lhe os passos esteja onde estiver! Não é esse o desejo de todos? Quem é que não quer ter sua própria casa? Pois é, viva sua majestade o caramujo, aquele que não permitiu que o sistema financeiro da habitação ou os proprietários maus caracteres vivessem às suas custas! Na realidade, o caramujo defende, muito provavelmente, a propriedade privada porque o caramujo é própria propriedade privada!
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Tive um pesadelo. Sonhei que a casa em que moro o proprietário a queria de volta! No sonho, chovia a cântaros! Uma verdadeira tempestade, era água por todos os lados! Como não sei o que as imagens oníricas querem dizer, fiquei pensativo. Esse negócio de moradia para mim é um sufoco! Para se ter uma idéia de quanto sofro com isso, aconteceu de a casa ser vendida comigo dentro e sem nenhum aviso! Desde que moro em Jequié, percebo que estou muito mais para urubu do que para João de Barro! Urubu só pensa em fazer casa quando está chovendo, basta passar a tempestade que ele diz imediatamente: "urubu tem asas para que quer casa"!
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E nessa de ficar com a preguiça urubulina, vou recebendo pancadas. Tenho que arrumar as malas outra vez, não era pesadelo, não, mais uma vez o proprietário pediu a casa que estou morando, o que não posso negar é que o pedido, dessa vez, beirava ao ridículo! Já ouvi de tudo dessas figuras: um disse que precisava da casa senão a Caixa Econômica lhe tomaria a propriedade; mas nada que superasse o que disse o último, depois de uma reunião entre família: "precisamos da casa que você está morando", não é para rir, mas eu também preciso! O interessante é que ele disse que estava fazendo esse pedido a mim porque era seu amigo. Fiquei pensativo com tamanha deferência e lembrei que o maior dos reacionários da Bahia, morto recentemente, o ACM, tinha uma tirada que dizia: "para os amigos tudo, para os inimigos a lei". É, meus camaradas, coisas da propriedade privada, mas fazer o quê, cada um tem o "amigo" que merece...

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Nem direita, nem esquerda...

Há uma canção da Legião Urbana, Soldados, em que o Poeta Russo insiste em perguntar: quem é o inimigo, quem é você? Todas as vezes que a ouço, penso imediatamente na situação que estamos vivendo hoje! Essa pergunta traz uma inquietação que nos auxilia a pensar as questões ideológicas para além da percepção pós-moderna que, cotidianamente, nos é imposta! Um exemplo dessa falsa homogeneidade é vista nas discussões acadêmicas! Somos todos uma massa amorfa, onde quase não se percebe as "colorações" ideológicas! Aqueles que resolvem demonstrar que não comungam com o discurso de "todos", são chamados de "radicais", "xiitas" e outras adjetivações menos "nobres"! Para escapar dessa "perseguição" ignominiosa devemos calar para não nos sentirmos isolados ou bradarmos a plenos pulmões, deixando explícitas as nossas convicções?
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Estamos todos tão "parecidos" que fica difícil saber de que lado cada indivíduo está, se é que ainda nos é "permitido" ter lado! Lógico que é isso que as forças hegemônicas querem que acreditemos! O PFL, um dos maiores partidos de direita do país, sabendo disso, virou Democratas! "Ora, bolas"! Dirão imediatamente os "pós-todas-as-coisas", "não há mais diferenças. Temos que nos orgulhar com a lição de democracia que demos ao mundo ao elegermos um presidente que é um ex-metalúrgico"! Neste sentido, apenas os "ortodoxos" e ultrapassados ainda querem insistir neste negócio de luta de classes: não existe mais direita e esquerda, o mundo é pós-moderno, tudo se incorpora a tudo num piscar de olhos! Não há um só político brasileiro que diga ser de direita, muito provavelmente tergiversará, dizendo que essa é uma discussão do segundo quartel do século XIX!
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Essa tentativa de justificar o consenso, termina colocando todo mundo no mesmo "balaio de gatos", já que da forma como se configuraram as articulações, se estabeleceu uma confusão tremenda, deixando boquiabertos até os mais esclarecidos. Se uma pessoa tivesse saído do Brasil, antes de 2002, e fosse passar férias prolongadas em Saturno, ficaria surpreendida ao ver que mesmo sem "estar" no poder na Bahia, muitos dos antigos aliados do carlismo, continuam dando as cartas, sabendo que em tese, que isso fique bem claro, o governo está nas mãos do Partido dos Trabalhadores. O que se poderia dizer do governo Jacques Wagner, nesta equação? Qual é a "direção" do governo da Bahia? Esquerda? Direita? Centro? Um gaiato pode sair bradando: N.R.A.: nenhuma das alternativas anteriores! Neste diálogo de surdos, sem ter a noção de quem é o inimigo, a esquerda está mais perdida do que cego em tiroteio. Os mais antigos diriam: bons tempos aqueles em que o inimigo estava bem visível, logo ali à frente, hoje, com o falso consenso instituído, a pergunta do poeta legionário corta a carne como navalha: quem é o inimigo? Sem essa resposta continuamos perdidos no espaço...

sábado, 18 de agosto de 2007

Volta às aulas...

Retornamos às aulas, acabou a greve das estaduais baianas! Entre paralisação e greve, foram quase três meses e, por estranho que pareça, o impacto político e econômico pode ser considerado nenhum! Ninguém falou dela, não repercutiu, sequer entre nós! O grande aprendizado, se é que é possível dizer isso, foi que alguns perceberam que independente do nome ou partido, quem assume a direção do Estado capitalista, vai defender com unhas e dentes os interesses dos dominantes, vai garantir a propriedade privada, nada mais que isso! A greve mais uma vez nos mostrou o quanto algumas categorias não conseguem organizar seus quadros, minimamente, para pensar os seus objetivos políticos e econômicos mais imediatos. O perceptível é que estamos sendo engolidos pelos nossos próprios monstros, envolvidos em nossas próprias armadilhas! Os caminhos construídos nos levaram a um beco sem saída. Em muitos lugares quem está gerenciando o Estado são pessoas que historicamente defendiam outro modelo social e pensavam na greve como um instrumento de luta dos trabalhadores, hoje, associam, descaradamente, greve com férias! E olha que muitos chegaram a ser presos por se posicionar politicamente dessa forma. Isso posto, pode-se perguntar: o que mudou? A melhor resposta talvez seja: mudaram as estações, isso ninguém pode negar, mas os camaradas também mudaram a ponto de incorporar o discurso que ao longo de décadas recharcharam veementemente!
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Logo no início, o impasse: a greve aconteceria em todas as estaduais baianas ou se alguma desistisse, todas recuariam? Saíram aos trancos e barrrancos UESB, UEFS e UNEB, mas a UESC disse não! O corte de salários, previsível, minou decididamente o movimento. O primeiro baque foi a saída da UNEB. Alguns professores afirmaram que o "comando" não os representava, por isso, retornaram, "o salário não fora o principal motivo", dissera um deles. Na UESB, o desespero pela falta de salário chegara ao limite, caiu a segunda "fortaleza"! Faltava apenas o governo quebrar a UEFS, que também não resistiu e cedeu à pressão. O grande problema sindical agora é não permitir que o descrédito e a apatia dominem os ânimos e provoquem mais desagregação ainda. O que não sabemos é se estamos no fundo do poço ou ainda é possível descer mais ainda! Muitos pensaram que com a assunção de um governador de um partido com uma história de luta, seríamos tratados com outros olhos. Pensar assim é não analisar os caminhos feitos por aqueles que viraram políticos profissionais e o partido apenas uma fachada. Penso, também, que a greve conseguiu desvelar a face do governo, mostrando que quem dirige o Estado capitalista, ou segue as suas diretrizes ou irá penar no mais fundo dos infernos. O que fazer? Está aí uma pergunta cuja resposta levaremos algum tempo para encontrar a resposta, já que sem identidade, sem um projeto social diferente do que está posto e sem direção, a categoria docente, de uma forma geral, seguirá sofrendo do mal da acomodação e sem perspectivas. Quem sabe em outras estações consigamos pensar alternativas possíveis que nos libertem da letargia e do "silêncio", parece que só restam os escombros, estamos todos em frangalhos e nada de novo acontece no "front"...

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

"Piratas"...

A revista Caros Amigos lançou, há quase dois anos, um número especial onde ironicamente questionava a nossa índole com a frase: somos todos desonestos? Lembrei disso porque passando por inúmeros vendedores de produtos não "originais", sem a hipocrisia que gira em torno desse mercado informal, onde pululam aos montes CDS e DVS e artigos outros, com uma variedade espantosa, não resisti à tentação e comprei alguns exemplares! Como já disse anteriormente, a multiplicidade de títulos surpreende até o mais cético dos consumidores! Na realidade, hoje, mal acontece uma estréia nos cinemas, esses "conquistadores dos mares" já a têm em "primeira mão"! Surpreendentemente, para uma cidade sem cinemas, o chamado mercado "pirata" supre um público sequioso! Não sei bem o porquê, mas me vem à memória o questionamento da revista: somos todos desonestos? Aprovamos sub-repticiamente as ações que não são consideradas legais? Sou desonesto quando compro um "piratinha" ali na esquina?
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Enquanto pensava nisso, quase sem querer, me veio a imagem do senador Renan Calheiros e tantos outros que fazem parte da fauna do parlamento brasileiro! Não consigo esquecer daquele deputado gaúcho, o Onyx Lorenzoni, que dizia: "há uma diferença entre propina e 'mimo'"! Não, não é para rir! Sou, imediatamente, assaltado, não sei por que essa palavra teima em aparecer, pela questão trazida pela revista: será que somos todos desonestos? Isso está no nosso DNA? Trazemos isso de berço? É verdadeira a afirmação que diz que basta termos uma chance, por menor que seja, que burlamos a lei e não pensamos duas vezes? O exemplo dos parlamentares "mimosos" pode ser estendido para todas as pessoas? Não é estranho, para não dizer indecente, que os que deveriam dar exemplo, são os que mais transgridem as leis que eles mesmos elaboram? Se verificarmos de forma bem rápida a folha corrida de alguns dos que são responsáveis pelo parlamento, percebemos que aquela música do Chico Buarque se materializa de forma contundente, dizendo: "chame, chame, chame o ladrão"!
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Em todos os momentos que coloquei os meus "piratinhas" para rodar, por "estranha ironia", apareceram mensagens de cunho "esclarecedor"; nestas, a recomendação é não comprar nada que não seja original, não à pirataria! Eu rio todas as vezes que as vejo. Devo admitir que os produtos "piratas" são "originais" até nisso! Não parece surrealismo no "piratinha" aparecer uma mensagem dizendo não compre "esse" produto?! Duas são singulares pela forma como foram construídas, diria, uma obra-prima do "terror" moral! Imagina aí, aparecer um sujeito na tela, roubando supermercado, bolsa, celular e por fim a pérola: quem compra pirata é ladrão, porque um sujeito honesto não cometeria tal ato! A outra é aquela do pai que chega em casa com o seu "piratinha", todo satisfeito e o guri, do alto da "sapiência infantil", diz que a tia disse que o sinal da antena é "pirata" e que roubou o brinquedo do amiguinho, comparando a atitude com a do pai e este, mais que rápido, responde: não, isso não pode!
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Não estou defendendo e nem atacando o mercado alternativo, muito pelo contrário, tento entender a lógica. O mercado paralelo se desenvolveu porque tem um público ávido; fala a verdade, não é, justamente, isso que diz a lógica capitalista quando se refere às questões de oferta e procura? Neste sentido, elas são estimuladas por uma indústria que quer ganhar muito, mas muito mais do que elas podem pagar. O certo é que nós queremos pagar o mínimo possível e tendo possibilidade de fazê-lo, nada nos constrange! Alguns, para se "defenderem", poderão usar o mesmo argumento do Lorenzoni e dizer que a compra do pirata é um "mimo" do mercado alternativo, (pirata, não!) para com aqueles que não dispõem de recursos para pagar por um produto que custa R$ 49,00 e pode ser encontrado por R$ 5,00, embora já existam pesquisas que sinalizem que os produtos vendidos na periferia do mercado são consumidos não apenas por aqueles que têm renda considerada indecente, mas por muitos dos que têm altos ganhos! Êta, lá vem a pergunta de novo! Se não há distinção de classe, (pelo menos aí, ainda não!) na compra dos produtos "periféricos", poderia se afirmar que todos somos desonestos ou o buraco é mais embaixo?...

terça-feira, 14 de agosto de 2007

Presente de Manezinha...

Estive em Salvador para comemorar meu aniversário, 07/08, e rever pessoas que gosto demasiadamente; entre essas figuras estavam o "cantor" Menino Ró, grande sucesso nas paradas da Fazenda Grande e Manuela Cássia, minha filha querida! Um momento delicioso para mim! Aconteceu um fato pitoresco, aliás, é muito difícil não acontecer fatos pitorescos em aniversários! É que entre os convidados havia uma "guria" de Florianópolis e por conta disso descobri que os indivíduos que nascem naquela ilha são florianapolitanos, mas que popularmente são chamados de mané! E eu que sou um Manoel, e sempre abominei esse apelido, percebi que para eles não há nenhum aborrecimento! Mas, voltando à habitante da ilha, depois de algum tempo, parecia que a conhecia a longos anos. Ficamos tão próximos que ao invés de chamá-la pelo seu nome de batismo, Lusi Avegou, só a chamava de Manezinha, coisa de gaiato, imagina ficar "zoando" as pessoas logo no primeiro contato!
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A presença dela foi uma surpresa, porém o mais extraordinário foi o presente que a manezinha me deu, aliás, um presentão! Juro que não sei quem foi que disse para ela que eu gostava de jazz. Rapaz, não é que me trouxe um presente deveras saboroso! Um livro sobre Jazz do Roberto Muggiati chamado New Jazz: de volta para o futuro, esclarecedor e que mostra de forma bastante didática, os caminhos seguidos pelo New Jazz, e tudo isso com uma abundância de detalhes e precisão que quase não resisti à tentação de sair por aí catando toda a discografia "sugerida" pelo autor, uma delícia, um presente maravilhoso! Coisa de louco, diria a Manezinha. Na verdade, uma guria de muita sensibilidade, não tenho nenhuma dúvida que ela é uma adivinha!
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Sei que já disse isso por aqui, mas vale à pena repetir: não há melhor presente que um bom livro e quando ele vem associado à paixão pelo assunto, não tem nada igual, pura degustação! Existem outros elementos que não podem ser esquecidos, mas aquele que mais chama atenção é que a leitura é uma grande estimuladora dos neurônios e a Manezinha parece que é especialista em escolher bons livros. Entre os livros que compunham seu arsenal particular, havia um que acho soberbo: Lavoura Arcaica, de Raduan Nassar, essa guria é abusada mesmo, conseguiu lê-lo no avião entre Porto Alegre, sua segunda casa, e Salvador! Mas não parou por aí. Não satisfeita com o torpedo presenteado, guardou outro petardo na mochila para o fim da festa! Quando pensei que a Manezinha já tinha dito tudo. Convenhamos, que mais essa guria de florianópolis poderia "aprontar", depois de me proporcionar o encontro ao vivo com os young lions? A Manezinha deu-me uma camisa oficial do Esporte Clube Vitória! Não consegui dizer mais nada...Mary, Roberto Carlos 4ever!

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Carros...

Há alguns meses fui interpelado por um estudante curioso que me perguntou qual a razão de ainda não possuir um automóvel; minha resposta foi a mais óbvia possível, até para evitar constrangimentos, disse-lhe que não sabia dirigir! Esperei que ele se contentasse com a resposta, mas, para minha surpresa, retrucou: "por que, então, não procura aprender e compra um?" Neste momento, percebi que poderia dar duas respostas; a primeira, dizer que ele tinha razão, afinal é comum àqueles cidadãos com uma renda considerada "enganadora" comprar um veículo, pois com o sistema de "quinhentas" prestações, não há desculpas que justifiquem a ausência de tamanho sonho de consumo; a segunda, mostrar que nem tudo passa pela necessidade de ter que ter um automóvel, ou seja, não somos obrigados a possuir coisas porque isso foi determinado por uma entidade supra-humana; perder o controle das nossas decisões mais comezinhas nos leva a querer possuir bens, que por sua vez nos conferem uma certa distinção, consumidores guiados pela mão invisível do mercado!
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Ter um carro é sinônimo de "status" e tem mais, quanto mais valioso ele for, mais importância tem o seu dono no seu locus. Quase sempre, o carro adquire mais relevância e importância que o seu dono, não é o indivíduo que possui o carro, mas o carro que possui o sujeito, é uma relação quase sexual! Essa forma de se enxergar a realidade termina no paroxismo da coisificação da pessoa: "não somos homens, máquinas é o que somos", a máxima foi invertida completamente! Essa necessidade de mostrar importância a partir da posse de bens é comum na sociedade em que vivemos, isso é meio óbvio, ou seja, quem tem, mesmo que seja o mais perfeito idiota, é considerado bem sucedido. O carro se tornou emblemático nas nossas relações, não tê-lo nos envia ao mundo dos infelizes e despossuídos! Como pode no mundo em que vivemos, o típico "classe média" não ter um automóvel? Não tem sentido, é o nosso cartão de apresentação! Que pai vai permitir que sua filha se case com um sujeito que não tem um carro? Só se for louco! Quem casa quer carro, de novo a inversão do velho aforismo!
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Morando em uma cidade pequena, percebo o quanto é necessário para os possuidores mostrar que têm o objeto do desejo que os torna visíveis! O sujeito mora perto da banca de revista, distante não mais que 5 minutos, mas precisa ir "montado" no carro, a pé? Nem pensar! Pode faltar qualquer coisa, menos aquilo que lhes dar visibilidade que é seu carro! Há uma preocupação maior com a imagem construída do que com a realidade vivida, valoriza-se muito mais o portão belo e esculpido do que o interior da residência! Sabemos todos que existe a necessidade premente da redução de poluentes na atmosfera. Um cientista brasileiro da área de energia afirmou que é urgente se buscar uma saída através dos transportes alternativos não só pela questão da poluição, mas também no sentido de espaço, com a quantidade de veículos nas ruas das grandes cidades, elas não têm mais para onde crescer, sabe-se que carros conduzem poucas pessoas, exemplo típico disso é a cidade de São Paulo. A cada dia são "jogados" quinhentos carros em suas ruas que não têm nenhuma condição de absorção de tamanho volume! O chato de tudo isso é que as soluções apresentadas não fogem do lugar comum. Hoje, a palavra da moda é movimento sustentável, desde que a lógica do lucro não seja molestada, seguimos cegamente uma rota de colisão e sequer abrimos mão de um fantasioso e enganador conforto...

quarta-feira, 8 de agosto de 2007

Cínica Esperança...

Vou dizer uma coisa que pode chocar os puristas de plantão: é excessivamente enfadonha e cínica a forma como é anunciado e realizado o tal do "criança esperança"! Tenho ânsias de vômito quando vejo aquelas "chamadinhas asquerosas", não querendo outra coisa que nos extorquir uma grana, na realidade, fazer boas ações com o dinheiro dos outros é uma delícia! Não tenho nenhuma dúvida de que este não é um país sério, caso fosse, não permitiria que sua infância fosse transformada em "programa de auditório"! É assistencialismo barato da pior espécie e, o que é mais grave, feito às custas dos obtusos que ligam para aqueles números mercenários! Contudo o ato de fazer a ligação funciona como um calmante para as consciências dos que querem resolver os problemas insolúveis dos milhões de miseráveis que gravitam nas mais diversas regiões do país, afinal a pobreza e a miséria são atributos indissociáveis do processo de exploração do capital sobre o trabalho, além de render lágrimas de audiência!
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Quem dera que a esperança chegasse para as crianças das inúmeras favelas do Rio de Janeiro, por exemplo, ao invés de balas perdidas, traficantes e policiais! É certo que as boas ações dos que doam sete, quinze, trinta ou mais reais minimizam e dão esperança a alguns, enquanto a grande maioria fica na desesperança, mas os "doadores" podem dormir tranquilos por terem feito sua boa ação! Salvaram almas das ruas, das drogas, dos guetos, dos mangues, colocaram seu pingo d'água no incêndio da floresta tal e qual faz o beija-flor! É bem possível que a qualquer momento uma emissora concorrente resolva entrar na briga pela audiência e lance o seu adulto esperança, tendo o intuito de ajudar os índios incendiados e as empregadas espancadas, por algumas crianças bem nascidas! O agravante é que a emissora de televisão transforma a pobreza em um grande e suntuoso espetáculo, recheado de astros e estrelas, não, isso era no passado, hoje eles são celebridades! Ainda que tenha a UNICEF cuidando do "caixa", o certo não seria termos políticas públicas direcionadas à população infantil ao invés de espetacularização da miséria?!
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Fico me perguntando como deve ser bom para o ibope da emissora, que a cada ano nos convoca a doar, ter sob sua batuta o gerenciamento dos sonhos de milhões de crianças, fazendo seu canto da sereia! Programas desse tipo parecem-me que tripudiam dos que não têm com a moral de que quem se esforça tem seu lugar ao sol! Sim, porque ações como essas se perpetuam, são um band aid no câncer! Qual seria o objetivo final? Acabar com a situação em que vivem as crianças brasileiras que precisam de assistencialismo, dos bolsas esmolas para serem reconhecidos como cidadãos? São tantas as edições do "esperança" que fico me perguntando se o objetivo não é manter tudo como está para que a cada ano podermos dizer que fizemos algo para erradicar os males que afligem as pobres criança brasileiras e que um dia, com esperança isso vai acabar, talvez o mais indicado fosse nos dias de realização do programa a emissora doasse todo o seu faturamento para os pobres e desvalidos que ficam repletos de esperança naqueles dias dourados, ao invés de ficar nos enchendo a paciência nos mandando ligar, contudo é muito, mas muito mais interessante fazer beneficência com o dinheiro alheio...

quinta-feira, 2 de agosto de 2007

"Línguas" do Brasil...

Todo mundo sabe que, e isso não é novidade para ninguém, o único povo do nordeste que não tem sotaque é o baiano! Eu sei que um número ilimitado de pessoas não acreditam no que digo em momento algum, muitas são as razões para que isso ocorra, todavia vou citar apenas duas. A primeira está relacionada com a televisão, a segunda, também! O que aconteceu foi que na década de 1970, uma novela de nome Gabriela, baseada no romance homônimo de Jorge Amado, protagonizada pela Sonia Braga, inventou um "jeito" baiano de falar, desde então, somos prisioneiros dessa idiossincrasia televisiva! As pessoas de outras regiões, que ainda não nos visitaram, ficam com essa impressão errônea dos baianos! Ainda que muitos dos que nos visitam ficam restritos a Salvador! Quem estiver duvidando do que estou dizendo é só prestar atenção na "moça" do tempo do Jornal Nacional, da Rede Globo, que vai perceber que tenho plena razão no que digo. Ouçam a Rosana Jatobá, que é baiana, falando e perceberão que a tese é correta, ou seja, baiano não tem sotaque algum!
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O Brasil é um país imenso com características muito peculiares para cada uma de suas regiões, a consequência natural é temos os "falares" mais variados possíveis! Neste contexto, pergunta-se: qual é o "sotaque" dos brasileiros? Falamos a partir de que lugar, ou melhor, qual é o nosso lugar? Brinco sempre com aquelas pessoas que estão aprendendo inglês ou outra língua qualquer e que tentam, desesperadamente, "falar" sem sotaque algum! Rio, por entender que isso é impossível, sempre vai se falar a partir de algum lugar, ou seja, daquele que é hegemônico! Quando as pessoas aprendem inglês americano, por exemplo, em qual das cidades americanas eles se baseiam para se expressar? O inglês ensinado nestes cursos está referenciado onde? Nova York? Boston? Chicago? Em qual dessas cidades? Partindo da premissa da ausência de sotaques, pode-se afirmar que todas essas cidades têm uma pronúncia comum?
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Uma professora de um curso de mestrado em Salvador, na Bahia, exigiu que o estudante pronunciasse os nomes dos autores estrangeiros "corretamente", dizia ela que era inadmissível um estudante de pós-graduação não conseguir pronunciar igual ao "original"! Costumo chamar essas "figurinhas" de neo-colonizadas. Ficam tentando ser iguais aos "gringos" na pronúncia, terminam negando as peculiaridades dos falantes locais! A grande ironia do fato é que a professora se vincula a uma linha de pesquisa que discute os - Processos Civilizatórios: educação, memória e pluralidade cultural! Os franceses na copa do mundo de 1998 não conseguiam pronunciar o nome do jogador brasileiro Bebeto, repetiam o tempo inteiro: bêbetô! Dentro da lógica anunciada pela docente, estaria a pronúncia dos jornalistas franceses errada?
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O Brasil não costuma levar a sério os seus inúmeros "falares"! Percebo uma espécie de assepsia dos sotaques e a imposição de um falar que, "supostamente", não pertence a lugar nenhum! Caso isso seja verdadeiro, se um estrangeiro quiser aprender a falar o português do Brasil, em que cidade ou região estará situado o "falar": Pará? Pernambuco? Goiás? São Paulo? Paraná? Nem estou levando em consideração os diversos "sotaques" dentro dos próprios estados que são inúmeros! Exemplo? Nasci em Salvador, moro em Jequié, no interior de Bahia. Quando chego em minha cidade natal, dizem que estou falando diferente! O que se percebe é que há diversas "línguas" dentro da língua brasileira! Por que então não vemos esses incomensuráveis "falares", por exemplo, no jornal da TV? Por que o repórter de Pernambuco tem que falar "igual" ao do Rio de Janeiro? Não teremos uma "neo-colonização" interna se impondo? Por que negar a pluralidade dos diversos sotaques brasileiros? Por que um garoto que mora nos confins do Amazonas, desejando estudar comunicação tem que negar sua "língua" local se quiser trabalhar em uma rede de televisão que cubra todo território nacional? Qual é o "sotaque" hegemônico falado no Brasil? Somos "colonizados" por qual das regiões brasileiras? Pois é, comecei dizendo que baiano não tem sotaque, se a verdade for outra, isto é, se temos realmente sotaque, quem diz qual deve ser o sotaque da mídia brasileira e por que não ouvimos as vozes do Brasil na televisão?...