terça-feira, 8 de maio de 2007

E a musa chorou...

O Troféu Maria Lenk (antigo Troféu Brasil) realizado na semana passada, no Parque Aquático Julio De Lamare, no Rio de Janeiro, classificou os representantes da natação brasileira para os Jogos Panamericanos de 2007; seletivas com esse intuito não têm nada de extraordinário, se algo patético, para não dizer ridículo, não houvesse acontecido. A atleta Mariana Brochado, grande favorita, pediu desculpas ao país pelo "fracasso", por não ter obtido o índice e desabou em lágrimas! O esporte de alto rendimento, enquanto espetáculo, utiliza muito os aspectos emocionais para atrair o grande público, no sentido de fazer com que as pessoas a partir da empatia se sintam como o sujeito que está competindo, há uma espécie de simbiose entre aquele que é mero espectador e o atleta, desse modo, a derrota em alguns casos comove a ambos, levando-os à tristeza extrema!
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No esporte de uma forma geral e no de alto rendimento em particular, a possibilidade da derrota é parte integrante da equação, mas se isso é óbvio, por que, então, todo esse constrangimento causado pela não participação de Mariana Brochado nos Jogos? Na verdade, o esporte costuma levar a exageros, de cenas da mais absoluta violência a cenas de beleza comovente; ninguém esquece daquele Grenal em que a torcida quase "incendiou" o estádio ou aquela cabeçada de Zidane em Materazzi na copa de 2006; como não recordar a plasticidade das pedaladas de Robinho sobre Rogério na final do brasileiro de 2002 ou o gol de Marcelinho que lhe valeu uma placa na Vila Belmiro?
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As metáforas associadas ao esporte levam simples sujeitos a se sentirem imortais, indestrutíveis - são tigres, gênios, pumas, guerreiros - com a responsabilidade de confirmar a imagem construída, neste caso, há mais um elemento associado à vencedora que é a beleza, eis aí a razão do acréscimo do termo "musa" à nadadora, além de nadar é bela! Musas são entidades, originalmente filhas de Zeus, pai de todos os deuses do Olimpo! A derrota nas seletivas de uma figura como a Mariana Brochado traz a necessidade de explicação e temos a partir disso as teorias mais extravagantes para justificá-la, embora todo mundo saiba que faz parte do jogo.
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Cenas em que os "imbatíveis" são derrotados deviam ser comuns, mas quando isso acontece vêm carregadas de situações nem sempre lisonjeiras! Recentemente em Melbourne, na Austrália, no Mundial de Esportes Aquáticos, Mikhail Zubkov saiu dando bordoadas em sua atleta e filha Kateryna Zubkova por ela não ter se classificado nas semifinais dos 100 m costas! O que o levou a tamanha violência e frente às câmeras do mundo inteiro? A derrota! Mas se ela faz parte do jogo e treinadores, em tese, são pessoas disciplinadoras, equilibradas e de bom senso, por que partir para a agressão e neste caso, espancar a própria filha? Talvez o crime desses vencedores seja justamente a vitória! Quem ganha sempre quando perde fica refém da imagem construída e incorporada!
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A derrota em competições sempre traz cenas patéticas, a ironia esportiva que levou a musa da natação às lágrimas, também fez outra vítima nas olimpíadas de Atenas de 2004. A favorita para a medalha de ouro, na ginástica de solo, era a Daiane dos Santos, mas o "incomum" aconteceu, ela errou e ficou em 5º lugar! Se o espetáculo esportivo não fosse colocado como uma guerra a ser vencida a todo custo, as derrotas desses atletas passariam despercebidas, mas como parece que está sobre os ombros desses "semideuses" o brio dos seus compatriotas, os comuns, quando vem a derrota todos se sentem derrotados e como fez Mariana Brochado pedem desculpas a uma nação inteira como se um simples ato esportivo tivesse uma dimensão para além do que ele é, apenas um mísero jogo em que há vencedores, mas para que isso aconteça, os perdedores são parte intrínseca do espetáculo, que na maioria das vezes se transforma em circo e pão!

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