sábado, 14 de abril de 2007

A falácia das cotas

A Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB - está iniciando a discussão a respeito das cotas para afrodescendentes e outras minorias. Tema polêmico por natureza, traz na sua raiz algo que aproxima, ironicamente, grupos considerados opostos politicamente. Percebo conservadores e "progressistas" falando a mesma língua!
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Os primeiros acreditam que todos podem chegar a qualquer lugar só dependendo do seu esforço pessoal, afinal as condições são iguais para todos, a mão invisível do mercado os orientará! Os segundos acham que cabe uma reparação a negros e indígenas por suas contribuições na construção do país, já que não tiveram qualquer recompensa por isso. A recompensa seria, aqui no caso, reservar "espaços" nas instituições de ensino superior para esses grupos que foram/são discriminados no acesso aos bens sociais.
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O que os aproximam é justamente o discurso do privilégio, da reserva de espaços, que neste caso, é reserva de mercado, da fatia que deve ser apropriada por aqueles que foram explorados e expropriados dos seus direitos de cidadãos ao longo da história desse país; entram nesta equação, os idosos, os deficientes de todos os matizes, não serei politicamente correto e usar o eufemismo, tão em voga, portadores de necessidades especiais, quando sei que estamos no modo de produção capitalista e que este seleciona os "eficientes", logo não caiamos no discurso hipócrita da defesa do diferente, quando, na realidade, o sistema quer os PNE que sejam eficientes para serem explorados, assim como o serão os afrodescendentes e indígenas!
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Não caberia o discurso de que as chamadas minorias são menos "competentes" para aprovação no vestibular tal como ele é, afinal não se questiona o formato seletivo do concurso, as provas são iguais para todos, o que se deseja é que os afrodescentes e indígenas disputem entre si e não mais contra os brancos e outros, inclusive os afrodescendentes que resolvam disputar as vagas fora das cotas!
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Um professor, ao defender a cota, salientou que o vestibular é seletivo, talvez até excludente não permitindo que esses indivíduos ascendam socialmente. Outra professora afirmou que é a favor, mas que tem "algumas" restrições. Por certo, o consenso não é a palavra que guiará esse debate, muito pelo contrário, a tendência é acirrar os ânimos. Na realidade, parece que a entrada na universidade resolve todos os problemas, ela seria o oásis; o estranho é que muitos desses professores que defendem as cotas reclamam e muito dos estudantes que entram pelos critérios em voga, afirmando, em alguns momentos, que não sabem escrever, têm dificuldades de interpretação e outras "deficiências". Existem pesquisas que apontam que os estudantes que entram pela via das cotas têm o rendimento superior aos que passam pelo funil do vestibular branco; o interessante é que a cota também representa um funil, ou seja, a cota não exclui a exclusão, teremos os "derrotados" de segunda ordem, aqueles que nem com cotas conseguem passar! Se a pesquisa afirma que as pessoas apresentam um bom aproveitamento, sabem, conhecem, o problema, então, é o formato do concurso vestibular, a sua extinção não seria solução mais óbvia?
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Neste debate, uma coisa está muito clara, e não vai aí nenhum trocadilho, é que as cotas em primeira instância, ira privilegiar uma Aristocracia Preta que luta, e é aí que os "progressistas" se aproximam dos conservadores, por espaços de poder, de ascensão dessa elite preta, quem defende as cotas em última instância, não está pensando na grande maioria dos desvalidos, das escolas sem estruturas dignas e professores mal remunerados, haja vista o anúncio do piso salarial, na extinção da exploração, mas em um projeto excludente e seletivo, nem um pouco diferente daquele gerenciado pela elite dominante...

2 comentários:

Ricardo Pereira disse...

ontem mesmo discutíamos cotas aqui na Unicamp, o assunto era outro e virou este, sei que o tema é controverso e nenhuma opinião favorável ou desfavorável parece-me isenta de preconceitos e de boas intenções, eu particularmente defendo a cota, não só para negros, mas para alunos de escola pública, para deficientes econômicos se o adjetivo for melhor, não gosto que uma faculdade como a Unicamp tenha bem mais alunos em seus cursos de classes médias altas para cima do que mais baixas, ainda que eu mesmo reconheça que integra a fatia privilegiada da história, ocorre que esta massa de alunos vindos de níveis sociais melhores produzem pesquisas que vão numa outra direção, muito mais aplicáveis por empresas privadas do que que colaborem realmente com mudanças necessárias em nossa sociedade, é dinheiro público investido em quem não precisa dele contra quem poderia se beneficiar dele caso as pesquisas fossem na direção deles e não de empresas que se beneficiam dos que nada beneficiam, ficou confuso no final? Ficou eu sei, realmente o assunto é delicado, mas creio que enquanto se discute o que é melhor, que as cotas continuem sendo aplicadas, mas concordo contigo que o problema está muito mais no vestibular, e no seu modus operandi, há muito intocável...

wager matias disse...

Prof quando ainda na graduação eram muitas as discussões que faziamos acerca da posição do M.E. a maioria concorda com elas, mas sempre discordei porque isso apenas ameniza e é o que o Estado faz é. Todos tem direito a educação superior e é isso que deve ser debatido. Saudações