sexta-feira, 11 de maio de 2012

Anjos Pretos...

Embora haja sintomas característicos quando estamos (lá ele!) prestes a ter um AVC (que os mais doutos chamam de AVE: Acidente Vascular Encefálico) no meu caso, não tive noção alguma quando o dito cujo estava "chegando", absolutamente nada, o mais estranho, para mim, é que dizem que conversei mais que "o homem da cobra"! Parecia que tudo estava bem. Na realidade, por essa razão, muitos não entendem depois de algumas demonstrações de que está tudo bem, tipo, um piscar de olhos, apertar a mão de alguém conhecido, etc., mais que de repente a pessoa perece, é um assombro para os que estão no entorno, "como isso pode acontecer", é o que dizem. Sou um bom exemplo por ter sobrevivido. Muitas das conversas que tive no período não ficaram registradas na "caixa laranja", nada! Quando disse isso para minha irmã Marta recentemente, ela, quase aborrecida, me deu detalhes da nossa conversa, não acreditando que aquilo era possível.
O AVC (AVE) leva quem foi acometido para um estágio, digo isso a partir da minha experiência pessoal, não sei se a ciência concordaria com tal disparate, entre estar vivo e morto simultaneamente, sei que algo mais paradoxal do que isso parece impossível, porém foi isso o que aconteceu comigo. Fica-se no fio da navalha, acho que essa metáfora ajuda um pouco a se entender o que é passar por um acidente vascular cerebral! Internamente, o nada, é um dormir sem sonhar; externamente, tudo parece bem para aqueles que têm uma prova de que estamos vivos e sãos. Na realidade, estou voltando a falar sobre o AVE (AVC) por dois motivos; o primeiro está relacionado com o caso do tio de uma amiga. Por ter sobrevivido sem sequelas, sirvo de "exemplo", sou levado a responder sobre impressões que, dependendo da minha resposta, tranquiliza a família, afinal, sou a prova viva de que é possível sair daquela situação, aparentemente, incólume, sem grandes problemas, quiçá, bem melhor do que antes! Voltamos sem querer à lógica formal que parece governar a nossas relações, isto é, se Manoel sobreviveu a tal situação, logo...  
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Isso me leva ao segundo motivo.Voltando a Jequié, reencontro Maurícia, (que você que está lendo esse destempero provavelmente não conhece) uma amiga que compõe o núcleo dos técnicos administrativos da UESB. Ela meio que rindo me pergunta se já havia eu saído do "tubo". No primeiro momento, não entendi muito bem o que queria dizer com aquilo, mas insistia e ria: "então, já saiu do tubo?" Como outras pessoas também ficaram curiosas, explicou que na primeira conversa que tivemos depois que me recuperei, dissera eu que o AVC fora como se eu tivesse entrado em um tubo; juro que não faço a menor ideia onde fui buscar essa figura de linguagem para explicar a sensação de morte que tivera. Mas Maurícia me chamou atenção para algo que não vinha percebendo. Ao usar a minha experiência, sem perceber, estava generalizando meu caso, ou seja, era como se todos os que tivessem um acidente vascular cerebral, o popular derrame, passassem pelos mesmos estágios que passei, reagissem da mesma forma. A prova mais cabal de que isso não era verdade se relacionava ao fato de sair dele sem nenhuma sequela, enquanto grande parte das pessoas não têm a mesma sorte. O certo é que o AVC é plural, cada experiência é única, individual, como sempre falei, não senti absolutamente nada, embora tenham me dito que me queixei muito de dor de cabeça, coisa que não lembro, não ficou nenhum registro. Para encurtar a história, alguém no meio daquela conversa, de forma irônica, me perguntou se eu não vira nenhuma luz me mostrando o caminho de volta. Nestes momentos, a religiosidade se manifesta até para aqueles que se dizem ateus (aliás, Millôr Fernandes já dissera que todo ateu deixa de sê-lo quando o avião levanta voo), a única coisa que me veio à cabeça, naquele momento, foi: "os anjos eram pretos e estavam de olhos bem fechados"... 

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