quinta-feira, 8 de abril de 2010

Salvador...

Penso que, no fundo, no fundo, somos uns idealistas inveterados. "Construímos" lugares, espaços, pessoas e não queremos que eles mudem, transformem-se em algo diferente daquilo que almejamos. Queremos que a primeira imagem, a primeira impressão que nos é saborosa não se modifique, seja eterna enquanto durem as reminiscências. Voltar a Salvador depois de tanto tempo morando fora causou-me esse sentimento. Encontro-me entre atônito com suas modificações e, ao mesmo tempo, desesperado. Será essa a cidade a mesma cujo mar sempre foi um elemento embriagador em minha vida? Na angústia provocada pelo "cartão postal" refletido diante dos olhos, num passeio vesperal, busco na memória aquela fotografia em preto e branco da cidade em que o menino-homem adorava passear, divertir-se em suas ruas, becos e esquinas e não a encontro. O homem-menino não quer acreditar naquilo que os olhos vêem! Não, aquela não é a cidade que ele via o mar com suas vagas a se enamorarem lá da Boca do Rio. "Nem poderia", responde seu alter-ego. "Por acaso, esqueceu aquele filósofo que os gregos chamavam de obscuro?" Um homem não se banha duas vezes no mesmo rio...Mas não queria saber de Heráclito, ante a destruição percebida na velha cidade, o que desejava "era que o prefeito desse um jeito na cidade da Bahia"
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Lugares antes vividos sozinho, hoje eram revisitados com sua cúmplice-mor. Esse caminhar lado a lado fazia com que buscasse na memória a foto da paisagem perdida, uma tentativa vã de apresentar à filha uma cidade que já não era mais nem a da sua infância, nem um arremedo daquilo que acreditava ser uma cidade. As ruas, as praças, os terminais que pegava o ônibus para voltar para casa, quando ia passar os domingos na casa da sua avó materna pareciam lugares inabitáveis. A Ladeira da Praça, que tinha em sua esquina a majestosa Padaria Paris, não passa de um logradouro decadente cheirando a urina e fezes dos mendigos que a freqüentam. A filha que de tanto ouvir o pai falar dos doces e iguarias que aquela padaria produzia, fez questão de levá-lo para rever o palco de um dos sonhos mais doces do seu pai, momento em que ele ficou sem saber como escolher qual dos doces em meio a tantas iguarias oferecidas na vitrine por uma senhora que passava. O que tinha diante de si já não era mais a padaria dos seus sonhos, o lugar perdera a majestade, em lugar dos doces que adocicavam o sonho do menino, hoje garrafas de bebidas ornamentavam as prateleiras; no entorno, na tarde nua, um homem mijava na rua, e olha que isso não é uma rima, mas uma constatação, talvez o pior desse quadro fantasmagórico era que o gesto já não mais escandalizava aos transeuntes, o homem mijava e as pessoas passavam apressadas. Salvador estava imunda, decadente e malcheirosa, e o que ele queria, ante o quadro de degeneração da cidade, era que o prefeito desse um jeito na cidade que o menino brincara, na cidade que agonizava sob os olhos daquele menino que quando crescesse não teria mais em sua memória a velha cidade de Salvador que desesperada pedia socorro e se afogava em seus próprios excrementos...

7 comentários:

Manuela Cassia disse...

Gostei do cúmplice mor!!!
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Pois é, tentei ver a Padaria Paris dos tempos áureos, mas nada mais encontrei que um mercadinho na beira da esquina, na subida da Ladeira da Praça. Esta é o retrato de nossa querida Salvador...

Manoel Gomes disse...

Pois é, minha cúmplice-mor, mas não deveria ser esse o retrato da cidade, com a quantidade de impostos pagos, não justifica algumas ruas do centro histórico estarem em petição de miséria, predios quase caindo aos pedaços, e olha que muitos dos que estão na ladeira da praça mereciam melhor tratamento...eu te amo, viu?

Lauro Xavier Neto disse...

MMMMMaaaaaaaaaannnnnnnooooooo, obrigado pela "galeria" inefável, muitas saudades do grande amigo. Estou precisando muito te ver, dar um abraço, acionar os neurônios... Mano a vida dá cada volta...

Jonatan disse...

andas pela bahia né?
jonatandon@yahoo.com.br

responda!

Manoel Gomes disse...

Bem, a Lauro, como disse agora está mais fácil oxigenar as idéias, estou mais perto. vamos ver se articulamos alguma coisa, por exemplo, vai acontecer o II EPMARX - II encontro de grupos de pesquisa Marxistas, na Federal de Pernambuco, nos dias 24 a 26 de maio de 2010, no meio do caminho entre JamPa e Salvador, o que você acha? vão estar: Jorge Luiz Acanda(Cuba), Mauro Iasi(UFRJ) Epitácio Macário(UECE),Newton Duarte(Estadual Paulista - Araraquara...vou mandar a programação por e-mail...
Quanto a Jonantan, é claro que estou na Bahia, a postagem sobre Salvador me "denuncia", não? rsrsrs...vamos organizar aquela conversa!?

Lauro Xavier Neto disse...

Oi Mano, manda mesmo a programação do II EPMARX, vamos nos ver!!!!!

Manoel Gomes disse...

Olha, mandei para o e-mail xavierneto2@hotmail.com veja lá, força sempre, camarada!!!