Todo mundo sabe que, e isso não é novidade para ninguém, o único povo do nordeste que não tem sotaque é o baiano! Eu sei que um número ilimitado de pessoas não acreditam no que digo em momento algum, muitas são as razões para que isso ocorra, todavia vou citar apenas duas. A primeira está relacionada com a televisão, a segunda, também! O que aconteceu foi que na década de 1970, uma novela de nome Gabriela, baseada no romance homônimo de Jorge Amado, protagonizada pela Sonia Braga, inventou um "jeito" baiano de falar, desde então, somos prisioneiros dessa idiossincrasia televisiva! As pessoas de outras regiões, que ainda não nos visitaram, ficam com essa impressão errônea dos baianos! Ainda que muitos dos que nos visitam ficam restritos a Salvador! Quem estiver duvidando do que estou dizendo é só prestar atenção na "moça" do tempo do Jornal Nacional, da Rede Globo, que vai perceber que tenho plena razão no que digo. Ouçam a Rosana Jatobá, que é baiana, falando e perceberão que a tese é correta, ou seja, baiano não tem sotaque algum!
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O Brasil é um país imenso com características muito peculiares para cada uma de suas regiões, a consequência natural é temos os "falares" mais variados possíveis! Neste contexto, pergunta-se: qual é o "sotaque" dos brasileiros? Falamos a partir de que lugar, ou melhor, qual é o nosso lugar? Brinco sempre com aquelas pessoas que estão aprendendo inglês ou outra língua qualquer e que tentam, desesperadamente, "falar" sem sotaque algum! Rio, por entender que isso é impossível, sempre vai se falar a partir de algum lugar, ou seja, daquele que é hegemônico! Quando as pessoas aprendem inglês americano, por exemplo, em qual das cidades americanas eles se baseiam para se expressar? O inglês ensinado nestes cursos está referenciado onde? Nova York? Boston? Chicago? Em qual dessas cidades? Partindo da premissa da ausência de sotaques, pode-se afirmar que todas essas cidades têm uma pronúncia comum?
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Uma professora de um curso de mestrado em Salvador, na Bahia, exigiu que o estudante pronunciasse os nomes dos autores estrangeiros "corretamente", dizia ela que era inadmissível um estudante de pós-graduação não conseguir pronunciar igual ao "original"! Costumo chamar essas "figurinhas" de neo-colonizadas. Ficam tentando ser iguais aos "gringos" na pronúncia, terminam negando as peculiaridades dos falantes locais! A grande ironia do fato é que a professora se vincula a uma linha de pesquisa que discute os - Processos Civilizatórios: educação, memória e pluralidade cultural! Os franceses na copa do mundo de 1998 não conseguiam pronunciar o nome do jogador brasileiro Bebeto, repetiam o tempo inteiro: bêbetô! Dentro da lógica anunciada pela docente, estaria a pronúncia dos jornalistas franceses errada?
O Brasil não costuma levar a sério os seus inúmeros "falares"! Percebo uma espécie de assepsia dos sotaques e a imposição de um falar que, "supostamente", não pertence a lugar nenhum! Caso isso seja verdadeiro, se um estrangeiro quiser aprender a falar o português do Brasil, em que cidade ou região estará situado o "falar": Pará? Pernambuco? Goiás? São Paulo? Paraná? Nem estou levando em consideração os diversos "sotaques" dentro dos próprios estados que são inúmeros! Exemplo? Nasci em Salvador, moro em Jequié, no interior de Bahia. Quando chego em minha cidade natal, dizem que estou falando diferente! O que se percebe é que há diversas "línguas" dentro da língua brasileira! Por que então não vemos esses incomensuráveis "falares", por exemplo, no jornal da TV? Por que o repórter de Pernambuco tem que falar "igual" ao do Rio de Janeiro? Não teremos uma "neo-colonização" interna se impondo? Por que negar a pluralidade dos diversos sotaques brasileiros? Por que um garoto que mora nos confins do Amazonas, desejando estudar comunicação tem que negar sua "língua" local se quiser trabalhar em uma rede de televisão que cubra todo território nacional? Qual é o "sotaque" hegemônico falado no Brasil? Somos "colonizados" por qual das regiões brasileiras? Pois é, comecei dizendo que baiano não tem sotaque, se a verdade for outra, isto é, se temos realmente sotaque, quem diz qual deve ser o sotaque da mídia brasileira e por que não ouvimos as vozes do Brasil na televisão?...
4 comentários:
quando voleti de Jequié para Jampa, meus amigos em uníssono diziam: "voltou com sotaque baiano!". Por vezes, fiquei constrangido percebendo que aquilo era uma crítica. Muitos nordestinos que migram para São Paulo ou Rio, quando voltam, são criticados por adquirirem certos hábitos sonoroso próprios daquela região. Vou reler seu texto e tentar compreendê-lo melhor, mas por enquanto aguardo um comentário sobre isto que escrevi, abraços!
Lauro, penso que não devemos ficar nos policiando a respeito de como falamos, não devemos ter vergonha nem do nosso falar e nem daquele que vamos incorporando "naturalmente" ao longo da nossa caminhada pelos mais diversos lugares, neste caso, nunca tinha notado que estava falando diferente do "povo" de Salvador, digo que agora sou de lugar nenhum, rs,rs,mas acho um preconceito perverso ficar impondo um falar específico, afinal somos seres mutáveis e sofremos influência. Veja como são as coisas, muitos ficaram te "zoando" porque vc voltou falando diferente, mas não há estranhamento,por exemplo, com a Rosana Jotabá que "invade" toda noite as casas das pessoas falando de forma totalmente diferente do pessoal aí de Jampa,e neste sentido este é um falar imposto, já que ela é baiana e vc, mais do que ninguém, sabe que baiano não fala daquela forma...é isso! Espero as outras críticas em relação ao texto, não esqueça que televisão é uma consessão pública, neste sentido, onde estão os diversos falares que ela deveria estar mostrando, onde está o público da consessão?
Olá MANO! No início do Disco Dois, da Legião, toca baixinho uma música (antes de Será) que é a Internacional Comunista, você já ouviu isso? Força Sempre!
Eu adoooooro sotaques! Cada região do Brasil tem um jeitinho de falar delicioso e, felizmente, a mesma língua. Sei de regiões na Europa onde, num mesmo país, há várias formas de falar em virtude dos muitos dialetos. Alguém do Norte tem dificuldade de se comunicar com o Sul!!!
Quanto ao comentário de Lauro e mesmo o teu, sobre não ter um sotaque definido, quando viajo (mesmo sendo por um final de semana), acabo assimilando um pouco do jeito de falar do local visitado. Assim, não sou de Siqueira, nem de Curitiba, nem de São Paulo, nem...
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